domingo, 10 de janeiro de 2021

Orçamentos dos clubes variam entre gestão e ficção: em quais confiar?

 No início de 2019, a previsão orçamentária de 11 dos 12 principais clubes do Brasil apontava que, juntos, eles teriam superávit de R$ 374 milhões na temporada. A realidade dos balanços trouxe um choque: o bloco terminou o ano com déficit de R$ 266 milhões. Isso sem considerar o Cruzeiro, que, sozinho, fechou com R$ 394 milhões negativos.


O quadro lança interrogações sobre a relação entre clubes e orçamentos. Neste início de ano, muitos já têm aprovada ou em fase de conclusão a previsão de receitas e despesas para 2021. Mas deve-se confiar nela?

Executivos costumam dizer que orçamentos são peça de gestão e não de ficção. No futebol brasileiro, é possível perceber quem leva isso à risca e quem tira o pé do chão na hora de planejar quanto vai ganhar/gastar.

— O Grêmio adota política conservadora e realista. A gente não conta com avanços de fase em competições. Só com a situação básica (fase de grupos), para não inflacionar receitas. Se a gente avança, lança como receita adicional — disse o CEO do Grêmio, Carlos Amodeo.



O clube gaúcho registrou em 2019 um resultado cerca de R$ 20 milhões maior do que o orçado. O Flamengo, ao conquistar Libertadores e Brasileirão, teve cerca de R$ 200 milhões a mais de receitas do que o estimado.

Orçamentos servem para controle interno, mas são acompanhados pela Autoridade Pública de Governança do Futebol (APFut), no caso de quem aderiu ao Profut, e a CBF. Na entidade, a apresentação é obrigatória dentro do processo de concessão de licença para a Série A. Mas não há um mecanismo legal que puna erro crasso na previsão.

— Na APFut, orçamento não é peça obrigatória de fiscalização. Mas pedimos pela primeira vez em 2017. Cinco clubes colocaram que seriam campeões brasileiros. E quem foi campeão mesmo (Corinthians) não botou — relata o contador Benny Kessel, que chegou a presidir a autarquia entre agosto de 2019 e março de 2020.

A performance esportiva e a venda de jogadores, geralmente, são os itens mais maleáveis. Aí mora o perigo, muitas vezes ignorado pelos conselhos dos clubes.

O Vasco estima que, em 2021, embolsará R$ 82 milhões em direitos federativos e mais R$ 25 milhões com mecanismo de solidariedade. Esse segundo item é o percentual de transações envolvendo jogadores formados na base do clube. Logo, o Vasco não tem a menor capacidade de impulsionar essa movimentação.

Para 2020, o Botafogo projetou que terminaria o Brasileirão em sexto, mas está na zona de rebaixamento. Em 2019, a diretoria orçou um superávit de R$ 71 milhões, mas fechou com déficit de R$ 21 milhões. Uma versão do orçamento de 2021 circula internamente, mas a gestão Durcesio Mello vai alterá-la.

— Se estamos querendo trabalhar de forma profissional, temos que transformar isso em realidade. Não podemos ter despesas que não vamos ter condição de cobrir — disse o novo vice geral e de finanças do Botafogo, Vinicius Assumpção.

No Atlético-MG, a nova gestão de Sérgio Coelho, por sua vez, está satisfeita com o que herdou na passagem de bastão feita por Sérgio Sette Câmara. Aprevisão de receitas para 2021 está em R$ 401 milhões, superávit de R$ 5 milhões.

— Eu tenho que considerar que é uma peça de gestão e não de ficção. Foi apresentada a um conselho com quase 400 membros. Tem que ser autêntica, não pode estar ali só para dizer que foi apresentada. Estão previstos R$ 120 milhões com venda de jogador. Pode não vender, mas temos vendido mais de R$ 100 milhões nos últimos anos. Está dentro de uma realidade. Tem uma receita com ingressos, considerando que vai ter público a partir do Brasileirão. Se a pandemia continuar complicando, não vai ter. Mas o que foi apresentado é possível cumprir o que foi aprovado. Se tiver uma variação de 5%, R$ 20 milhões para mais ou menos, é razoável — disse o novo presidente atleticano.

Ajustes estratégicos

A pandemia fez com que alguns clubes readequassem orçamentos. Nada de bilheteria e alterações no calendário, que impactam nos direitos de TV. No Flamengo, a previsão de receitas caiu de R$ 726 milhões para R$ 676 milhões. Ainda assim, há problemas: a estimativa do clube era chegar às semifinais da Libertadores.

O mercado dá boa resposta a quem acerta o alvo ou surpreende positivamente no orçamento. Flamengo e Grêmio, por exemplo, conseguem operações financeiras com certa facilidade, pela fama de bons pagadores. Durante a pandemia, o clube gaúcho pegou R$ 20 milhões de empréstimo

— A análise de crédito é facilitada pela transparência. A gente percebe uma melhor precificação, taxa de juros menor — disse Amodeo.

Fazer orçamento não é simples. Com o sistema SAP, software de gestão corporativa, o Flamengo avalia cerca de 180 itens. O desafio cresce porque fontes significativos, como TV, têm fatia variável relevante. No emaranhado de rubricas, os clubes precisam considerar outros aspectos.

— O ideal é calibrar bem o quanto abrir de informação que dê uma boa noção da saúde financeira e dos gastos, mas ter um certo cuidado para não passar informações estratégicas. Existe uma linha tênue. Vale para futebol e qualquer empresa de capital aberto — diz Alexandre Rangel, sócio-líder na área de Esportes da EY.

A dica vale para as estimativas com venda de jogadores e patrocínios:

— Nas sublinhas, se passar exatamente o que se espera, pode criar um teto na negociação. Mas na última linha, o orçamento tem que bater com precisão, ser realista.

Fonte: O Globo Online

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